Na minha altura de emigrante, viajava com tal frequência,
que os passageiros do avião e a tripulação já me eram familiares. O mesmo
acontecia com eles, já sorriamos e acenávamos com a cabeça para mais “uma
moeda, mais uma voltinha”.
Recordo-me de um Domingo à noite, dia de regresso à outra
realidade, em que mudava de língua e o ar nas primeiras horas era tudo menos
regenerador, com se todo o circuito respiratório entupisse, não por culpa da
cidade e tão pouco das pessoas, mas porque o coração fraquejava e não bombeava da
mesma maneira, desconcertando toda a orquestra que é o natural sistema cardiorespiratório
indispensável à vida. As saudades apertavam, logo a seguir à despedida.
Ao entrar no táxi, o português
- digo com carinho - agarrou a porta antes de a fechar, sim, como vemos no
cinema - naqueles filmes em que choramos, rimos e no final eles ficam juntos -
e cheio de coragem, pediu-me o número…
Normalmente, não sei como reagir – ainda hoje não sei! – A minha resposta muito pronta foi: “se o
destino quiser que nos voltemos a ver, encontramo-nos por ai”, não sei de onde
aquilo me saiu, nem acontecem este tipo de situações com a frequência necessária
para que a resposta estivesse na “pontinha da língua”. Aparentemente segura, sorri,
fechei a porta e com um gesto de despedida, o carro seguiu. Ainda me lembro do
ar espantado, chocado, de sobrolho levantado e boquiaberto, assim meio embasbacado,
coitado! Pelo caminho pensava: fiz bem, fiz mal, devia de ter dado?! Não
devia!? Que estupidez! Podíamos ter acabado a noite num sítio qualquer com uma
boa conversa, a jantar, a passear, sei lá! Não necessariamente um romance, mas
uma amizade. Tinha todos os condimentos. Éramos dois estrangeiros oriundos do
mesmo país, com a língua em comum e certamente com uma imensidão de diferentes experiências
da mesma cidade. Mas o meu pânico misturado com o meu receio pelo desconhecido, ao mesmo tempo tentar parecer calma e natural, deu nisto. Não, não o voltei a
ver. Passaram alguns anos, vou acreditar que está careca, barrigudo e espero
que feliz. E que não pense em mim, se é que ele mais algum dia pensou, como a
maluca que fugiu.
Se fosse hoje, aiii se fosse hoje... Não faço ideia do que fazia!
Não há receita para estes imprevistos, mas encaro-os como um
desafio ao meu poder de improviso, às vezes corre bem outras nem por isso. Mas acredito
que a maturidade também se reflecte nestas ocasiões e por isso as abordagens que
se seguiram, diferentes é certo, algumas, obrigaram-me a usar o bloqueador de
contactos, outras não passaram disso, mas pelo menos fizeram história.
As vantagens das relações que não demos oportunidade, são que perduram como “ses” romanceados pela imaginação.
As vantagens das relações que não demos oportunidade, são que perduram como “ses” romanceados pela imaginação.